Nos países do hemisfério, as mulheres sofrem as conseqüências do tratamento injusto e discriminatório, expresso em violência, em todos os estratos socioeconômicos, raciais e culturais. A situação específica da violência contra a mulher no Brasil gerou importantes ações dos setores governamentais e não-governamentais. No primeiro, uma das obrigações prioritárias do Conselho Nacional de Direitos da Mulher tem sido expor a questão da violência contra a mulher nos níveis políticos mais altos e levá-la ao debate público, trabalhando em prol das reformas de leis e apoiando os esforços que se realizam para assegurar que os responsáveis pelo cumprimento da lei e os servidores do Judiciário entendam as causas, a natureza e as conseqüências dessa violência. Isso contribuiu para incorporar, no Artigo 26, VIII da Constituição de 1988, o compromisso explícito do Estado de criar mecanismos para abordar e combater a violência no âmbito familiar. Em 1993, a Câmara dos Deputados instituiu uma Comissão Parlamentar de Inquérito para estudar a situação da violência contra a mulher no Brasil.
Como Estado Parte da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher, "Convenção de Belém do Pará", o Brasil assumiu uma série de obrigações específicas que, partindo da base, complementam as disposições mais gerais da Convenção Americana. A Convenção de Belém do Pará define no nível regional a violência contra a mulher como "qualquer ato ou conduta baseada no gênero, que cause morte, dano ou sofrimento físico, sexual ou psicológico à mulher, tanto na esfera pública como na privada".
a) ocorrida no âmbito da família ou unidade doméstica ou em qualquer relação interpessoal, que o agressor compartilhe, tenha compartilhado ou não a sua residência, incluindo-se, entre outras formas, o estupro, maus tratos e abuso sexual;
b) ocorrida na comunidade e cometida por qualquer pessoa, incluindo, entre outras formas, o estupro, abuso sexual, tortura, tráfico de mulheres, prostituição forçada, seqüestro e assédio sexual no local de trabalho, bem como em instituições educacionais, serviços de saúde ou qualquer outro local, e
c) perpetrada ou tolerada pelo Estado ou seus agentes, onde quer que ocorra. "Toda mulher tem direito a uma vida livre de violência, tanto na esfera pública como na esfera privada" (Artigo 3) e a que todos os seus direitos e liberdades fundamentais sejam protegidos e respeitados (Artigos 4, 5). É importante mencionar que o direito de toda mulher a uma vida livre de violência inclui o direito "de ser livre de todas as formas de discriminação" e "a ser valorizada e educada livre de padrões estereotipados e costumes sociais e culturais baseados em conceitos de inferioridade ou subordinação" (Artigo 6).
Os Estados ,parte da Convenção de Belém do Pará convieram em adotar, "sem demora", políticas destinadas a prevenir e erradicar a violência contra a mulher (Artigo 7). Isto significa que as Partes estão obrigadas a assegurar que os agentes do Estado respeitem o direito da mulher a uma vida livre de violência e a agir com o devido zelo "para prevenir, investigar e punir a violência contra a mulher (tanto na esfera pública como na privada), e que todas as vítimas da violência tenham acesso a procedimentos jurídicos justos e eficazes. As leis ou práticas jurídicas que "respaldem a persistência e a tolerância da violência contra a mulher" devem ser abolidas.
Desde meados da década de 80, o Brasil tem estado na vanguarda da região em matéria de desenvolvimento e implementação de estratégias para proporcionar serviços às mulheres vítimas de violência. Existem atualmente mais de 150 Delegacias de Defesa da Mulher em todo o país, que prestam serviços especializados às vítimas. Além de contarem com policiais especialmente treinadas para o cumprimento de funções normais relacionadas com a aplicação da lei, essas delegacias também pretendem oferecer serviços sociais e psicológicos integrados.
A violência doméstica é, de fato, a forma mais comum de violência contra a mulher no Brasil, e inclui o assassinato de cônjuges, a agressão doméstica, o abuso e o estupro. O primeiro refúgio para vítimas de violência doméstica no Brasil foi aberto como projeto piloto em 1986. Por meio de convênios com as Secretarias Estaduais de bem-estar Social, o Conselho de Direitos da Mulher oferece incentivos para promover o estabelecimento de refúgios adicionais para mulheres agredidas e seus filhos. Mais recentemente, em 8 de março de 1996, o Governo Federal lançou o Programa Nacional para Prevenir e Combater a Violência Sexual e Doméstica. O programa prevê ações em várias frentes, inclusive em relação a uma proposta no sentido de revogar a qualificação arcaica de crimes contra os "costumes", dada a certos delitos sexuais usualmente praticados contra a mulher.
Ainda que as Delegacias representem um avanço extraordinário no sentido de que abordam as causas e conseqüências específicas da violência contra a mulher, sua capacidade de proteção dos direitos da mulher continua a ser limitada em razão da falta de recursos humanos e materiais, da preparação insuficiente de pessoal especializado e não-especializado (nos quadros gerais da polícia) para tratar de casos de violência e de questões gerais da mulher, e da insuficiente coordenação com o restante da organização policial. As policiais especializadas existentes não podem atender a todas as vítimas. Nas áreas rurais em particular, as mulheres contam com muito poucos recursos oficiais contra a violência e para obter ajuda.
Além disso, mesmo onde existem essas delegacias especializadas, é freqüente que as queixas não sejam totalmente investigadas ou processadas. Em certos casos, as limitações tolhem os esforços envidados para dar resposta a esses delitos. Em outros casos, as mulheres não apresentam queixa formal contra os agressores. Na prática, limitações das leis e de outra natureza freqüentemente expõem a mulher a situações em que ela mesma de vê obrigada a agir. De acordo com a lei, as mulheres devem formular suas queixas numa delegacia e explicar os fatos a um policial para que este possa preparar uma "denúncia de incidente". Os policiais que não tenham sido suficientemente preparados talvez não estejam em condições de prestar os serviços requeridos e, segundo se informa, alguns deles continuam a tratar as vítimas de tal forma que estas se sentem envergonhadas e humilhadas. Para certos delitos, como o de estupro, as vítimas devem apresentar-se ao Instituto Médico Legal, ao qual cabe a competência exclusiva em matéria de exames médicos requeridos por lei para processar a denúncia. Algumas mulheres desconhecem esse requisito ou não têm acesso a essa instituição de forma justa e necessária para obter as provas requeridas. Estes institutos tendem a localizar-se em áreas urbanas e, onde existem, muitas vezes não dispõem de pessoal suficiente. Ademais, mesmo quando as mulheres tomam as medidas necessárias para denunciar a prática de delitos violentos, não existe garantia de que estes serão investigados e processados.
Apesar de o Supremo Tribunal Federal ter revogado, em 1991, a arcaica "defesa da honra" como justificativa para o homicídio da mulher, muitos tribunais ainda hesitam em processar e punir os autores da violência doméstica. Em certas áreas do país, persiste o uso da "defesa da honra" e, em algumas áreas, a conduta da vítima continua a ser um aspecto central a ser examinado no processo judicial relativo à ocorrência de um crime sexual. Em vez de se concentrar na existência dos elementos jurídicos do crime em questão, a prática de certos advogados de defesa - tolerada por alguns tribunais - acaba por tornar necessário que a mulher demonstre sua a pureza da sua reputação e a sua inculpabilidade moral para que possa utilizar os meios judiciais e legais à sua disposição. As iniciativas tomadas pelo setor público e pelo privado no sentido de fazer frente a violência contra a mulher começaram a combater o silêncio que tradicionalmente tem ocultado esse crime, mas ainda é necessário superar as barreiras sociais, jurídicas e de outra ordem que contribuem para que a impunidade em tais crimes prevaleça.
Mulheres sempre atentas ao nossos direitos, na dúvida procure um advogado!
Por: Jamily Teles de Lima
Perfil
- Gemma Galgani
- Pedagoga com pós-graduação em Relações Humanas - RH, Publicitária, jornalista com 10 anos de experiência no Jornal O Povo, desenvolveu um arduo trabalho no jornal Expresso do Norte, hoje colunista do Jornal A Folha e sobralense da Gemma.
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sexta-feira, 8 de maio de 2009
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